segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Silêncios

Decadente é a escada que não me atrevo pisar
Por não encontrar qualquer réstia de coragem
Incapaz de ter força para estes frios degraus
Sei que ignoro o objecto no alto da triste fortuna
E por isso fico, parado, imóvel no primeiro passo

Brilhante luz por detrás daquela porta negra
Que temo cruzar com meus olhos abertos
Perco a força por temer ser cego novamente
Os sentidos adaptados a uma constante treva
São grilhões que me prendem neste ponto

Moribundo ser o meu, desprovido de vontade
Que morre na previsão de uma qualquer repetição
Meus dedos temem falar da sua verdade oculta
E meus lábios são seres falecidos na entrega
Fico então em silencio, por medo da saudade

Amor e Vicio

Um café meio, um cigarro, um isqueiro
Objectos essenciais para a vida decadente
Mais um pouco, peço, mas a chávena é pequena
Apenas mais um pouco, o cigarro vai a meio

Pouso entre meus lábios os símbolos inertes
Do vicio, do pecado, da eterna fragilidade
Se me distraio o consolo arrefece, a chama apaga
Como em tudo, os totens de quem não vive

Mais uma beata, mais uma chávena desabitada
Destino de um tolo que apenas observa e consome
Nunca fico desperto que baste, a corrupção não cessa
Fico sempre com desejo, fico sempre aquém de mim

Desisto então de resistir e acendo mais um
Só mais um porque o dia foi longo e duro
Mas seria o mesmo se fosse de simples tédio
É assim, tudo, no amor e vicio, sempre insatisfeito

domingo, 14 de setembro de 2008

Ruínas

Doces as baladas às frias pedras da minha torre
Cantadas por um choro mudo e sem vontade
Num consolo mórbido, incurável e intencional
Do gelo branco e da neve solitária, caio também

Como pétalas de cerejeira, tingidas a dor e púrpura
Sobre as aguas lavadas da montanha quebrada
Corro eu também como fio de um sentimento
Para um mar sem lua, sem estrelas, sem sonho

Não existe destino para quem dura, apenas fado
Pois é em caminhos que não palmilho hoje, agora
Que perco toda a alma e coração, desejo ou devoção
De seguir a noite, pé ante pé, que persigo sempre, enfim

Num olhar, por fim, procuro tudo, pergunto, tento
Mas sem a luz do azul, nada vejo, nada é como é
E apenas tropeçando, tenho tacto para ver e saber
Que as pedras do meu chão, foram um dia paredes

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

Progresso em Retrocesso

Finalmente virado do avesso, com ou sem retorno
Vejo, ouço, cheiro, provo, sinto, mas não penso

No ponto de partida de um abismo que se abre
Encontro o conforto de uma queda sem amparo
Que o ar frio me corte, o rochedo me queime
No fogo interno e eterno de um inferno meu!

Mergulho enfim no sentimento que me persegue
Mais por mal que por um outro qualquer bem
Assumo nas mãos o sangue do meu sacrifício
E corto do peito o próprio âmago da impureza

Se em evolução de afecções quase infecciosas
Somos imoladas vítimas desse objecto frio
Que alguns tomam por quente como fogo
Eu digo apenas… amor… é o fim do jogo…

Regresso ao estado primordial da matéria etérea
E sofro a divisão Cartesiana nos prazeres e razões
Não mais me perco por alma que não me pertence
Pois não há alma que eu queira mais que a minha!

E a vida recomeça, após o quebrar do vaso caído
Sobre as cinzas nasce o nome escrito com os dedos
Do destino que há muito foi escrito… “Infrequentia”

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Auto-Citação

"Odeio tanto o meu passado como odeio a piedade alheia, ambos me incitam nojo..."

A. Afonso